Mostrar mensagens com a etiqueta Tipo Individual. Mostrar todas as mensagens
Mostrar mensagens com a etiqueta Tipo Individual. Mostrar todas as mensagens

quinta-feira, 14 de setembro de 2023

CASA DOS PATUDOS - "Transfigurar o Trivial"

 






Sala 1 - "Transfigurar o Trivial"
22 fotografias da série QUADROS


Sala 2 - "FLASHBACK"
10 fotografias e 34 câmaras do Século XX

Casa dos Patudos
De 9 de Setembro a 5 de Novembro 2023
por Convite de Ana Filipa Garin Scarpa














 
















sexta-feira, 23 de julho de 2021

ARQUIVO MUNICIPAL DE LOURES - "RETRO VISÃO"


 

"RETRO VISÃO" 

Arquivo Municipal de Loures
23 de Julho 2021 a 31 de Março 2022
20 câmaras da colecção e 32 fotografias "históricas" da Pentax
Curadoria de Filomena Cunha

A exposição junta, pela primeira vez, a colecção de câmaras e uma homenagem à sua antecessora Pentax Spotmatic. 
Foi comprada em Bissau em 1968 e percorreu, comigo, uma boa parte do mundo até ao advento do digital no princípio do século XXI.

















Fotografia do autor cedida por Mestre Homem Cardoso



Folha de Sala - CONFISSÕES DE UM COLECCIONADOR

A colecção de câmaras fotográficas antigas é uma espécie de lar da terceira idade, uma Babel de olhares desmemoriados.
As máquinas foram chegando dos quatro cantos do mundo, com seus achaques, deixando para trás, sabe-se lá onde, as suas memórias de celulóide.
Umas têm as lentes toldadas pelas cataratas do vidro, outras disparam devagar na dolorosa artrite dos seus obturadores e outras ainda sofrem da incontinência luminosa causada pelos orifícios nos foles.

Mas todos aqueles olhos que tanto viram ao longo do século XX, nos mais desvairados locais e situações, parecem agora pasmados pelo vazio dos seus interiores negros de onde os homens, invejosos e cansados das imagens fátuas do cérebro, arrancaram as películas em que o tempo se suspendera.
Este Alzheimer fotográfico do já visto só pode ser revertido fotografando outra vez.

A cada nova velha máquina que desperto do seu sono, qual bela adormecida, sinto-me um príncipe encantado.
Excita-me imaginar o que elas sentem quando abrem os seus olhos há tanto tempo cerrados. Quase tudo o que eu lhes possa mostrar, quando as disparo, deve ser para elas uma espantosa novidade.
Umas, posso imaginá-las na Chicago elegante dos anos vinte e tento perceber o seu choque quando abrem a lente para a arquitectura vanguardista da Expo.
Outras, podem muito bem ter servido para um fazendeiro boer fotografar as suas orgulhosas plantações, ou para um nababo do Pundjab eternizar o palácio e os seus adornos femininos; mas agora piscam o seu obturador em remotas aldeias transmontanas.
Elas viajaram no tempo e no espaço para, nos meus braços, sair da sua prolongada letargia.

É ao fotógrafo que cabe levar as máquinas a olhar e registar de novo, num reviver de mecanismos e gestos. Reter as suas memórias num enrolar de filme e depois pô-las frente a frente com as suas próprias obras.
Ao fazer isso, o fotógrafo reinventa a sua própria biografia. Repetindo os modos que há muito esquecera ou descobrindo os gestos que nunca tinha feito.

O visor à altura do olho ou da cintura, o avanço da película com alavanca ou com rotação da lente, a focagem por estimativa ou por sobreposição, a medição da luz pelo selénio ou pelo cádmio, o empunhar da câmara com dois dedos ou com as duas mãos, o disparo espontâneo ou encenado, um olho que pisca ou então um olho que arregala, são determinantes do que se pode fotografar e de como se fotografa.

Os desenvolvimentos tecnológicos e ergonómicos que percorreram o século XX não constituem apenas uma parada de tentativas e de abandonos, de sucessos e de fracassos; cada nova realização da técnica e do design transformou o gesto de fotografar de forma irremediável.
Ao reconstituir essa caminhada desvendamos as razões que tornaram incontornável o acto de fotografar.

Fernando Penim Redondo

 

sábado, 10 de julho de 2021

BIBLIOTECA MUNICIPAL DE CASCAIS - "Flashback"


 

"FLASHBACK" 

Biblioteca Municipal de Cascais
10 de Julho a 19 de Agosto
43 câmaras e 30 fotografias da colecção










fotografia de Celeste Ribeiro

fotografia de Celeste Ribeiro


Folha de Sala - CONFISSÕES DE UM COLECCIONADOR

A colecção de câmaras fotográficas antigas é uma espécie de lar da terceira idade, uma Babel de olhares desmemoriados.
As máquinas foram chegando dos quatro cantos do mundo, com seus achaques, deixando para trás, sabe-se lá onde, as suas memórias de celulóide.
Umas têm as lentes toldadas pelas cataratas do vidro, outras disparam devagar na dolorosa artrite dos seus obturadores e outras ainda sofrem da incontinência luminosa causada pelos orifícios nos foles.

Mas todos aqueles olhos que tanto viram ao longo do século XX, nos mais desvairados locais e situações, parecem agora pasmados pelo vazio dos seus interiores negros de onde os homens, invejosos e cansados das imagens fátuas do cérebro, arrancaram as películas em que o tempo se suspendera.
Este Alzheimer fotográfico do já visto só pode ser revertido fotografando outra vez.

A cada nova velha máquina que desperto do seu sono, qual bela adormecida, sinto-me um príncipe encantado.
Excita-me imaginar o que elas sentem quando abrem os seus olhos há tanto tempo cerrados. Quase tudo o que eu lhes possa mostrar, quando as disparo, deve ser para elas uma espantosa novidade.
Umas, posso imaginá-las na Chicago elegante dos anos vinte e tento perceber o seu choque quando abrem a lente para a arquitectura vanguardista da Expo.
Outras, podem muito bem ter servido para um fazendeiro boer fotografar as suas orgulhosas plantações, ou para um nababo do Pundjab eternizar o palácio e os seus adornos femininos; mas agora piscam o seu obturador em remotas aldeias transmontanas.
Elas viajaram no tempo e no espaço para, nos meus braços, sair da sua prolongada letargia.

É ao fotógrafo que cabe levar as máquinas a olhar e registar de novo, num reviver de mecanismos e gestos. Reter as suas memórias num enrolar de filme e depois pô-las frente a frente com as suas próprias obras.
Ao fazer isso, o fotógrafo reinventa a sua própria biografia. Repetindo os modos que há muito esquecera ou descobrindo os gestos que nunca tinha feito.

O visor à altura do olho ou da cintura, o avanço da película com alavanca ou com rotação da lente, a focagem por estimativa ou por sobreposição, a medição da luz pelo selénio ou pelo cádmio, o empunhar da câmara com dois dedos ou com as duas mãos, o disparo espontâneo ou encenado, um olho que pisca ou então um olho que arregala, são determinantes do que se pode fotografar e de como se fotografa.

Os desenvolvimentos tecnológicos e ergonómicos que percorreram o século XX não constituem apenas uma parada de tentativas e de abandonos, de sucessos e de fracassos; cada nova realização da técnica e do design transformou o gesto de fotografar de forma irremediável.
Ao reconstituir essa caminhada desvendamos as razões que tornaram incontornável o acto de fotografar.

Fernando Penim Redondo


sexta-feira, 16 de agosto de 2019

BIBLIOTECA MUNICIPAL DE CASCAIS - "Em vez de balas"



"Em vez de balas"  
Biblioteca Municipal de Cascais
S. Domingos de Rana 
16 Agosto a 7 Setembro 2019
17 fotografias da Guiné recolhidas em 1968/69














Em vez de balas

No dia 1 de Maio de 1968, o Tenente largou do Tejo, rumo à Guiné, a bordo da fragata Corte Real. Era então um jovem fuzileiro, de 22 anos, recém casado, que interrompera os estudos de Economia na Universidade de Lisboa.
Em Bissau integrou a 6ª Companhia, aquartelada no INAB, junto ao Geba. A missão consistia essencialmente na escolta de combóios de embarcações que abasteciam os quartéis do Exército no interior do território.
Subiu e desceu os principais rios da Guiné comandando as missões a partir das lanchas da Armada. Navegou no Cacheu até Farim, no Mansoa, no Geba e no Rio Grande de Buba. Ligou por mar a foz desses grandes rios e também foi a Catió, a Bolama e aos Bijagós.
A guerra era uma realidade penosa para quem como ele, jovem militante comunista, se opunha ao domínio colonial e defendia a independência das colónias. Partilhou esse drama pessoal com a sua mulher, que trabalhou como professora de História no então Liceu Honório Barreto.
A fotografia constituiu um paliativo. Ao fotografar a dignidade do povo guineense, a beleza das suas mulheres, o porte dos seus homens e o encanto das suas crianças, ele tinha a impressão de estar a fazer um gesto de amizade no contexto da guerra. Tal como muitos outros jovens da sua geração aprendeu, "no terreno", a grande lição da relatividade da nossa própria cultura.
O Tenente voltou a Bissau em 2018, cinquenta anos depois, para mostrar as fotografias feitas nos anos da guerra. Desembarcou do avião com uma mala de viagem repleta de ampliações. Felupes com os seu cachimbos, balantas em trajes de fanado, mandingas com as suas longas vestes.  Rostos, corpos e gestos impressos a preto e branco. O Tenente convivera com eles durante cinquenta anos, em Lisboa, através daquelas fotografias. Esse convívio fotográfico mantivera uma forte ligação afectiva à Guiné que, apesar disso, durante todo esse tempo, não voltara a visitar.

Quase não fotografou a guerra e os aparatos militares.
Dedicava-se a registar as gentes da tabanca, dos campos do arroz, os pescadores, e a garotada negra.
No contexto da guerra estas eram coisas preciosas, que corriam perigo, mas que um disparo da câmara fotográfica dava a ilusão de resgatar para sempre.
Quem lhe haveria de dizer que, 50 anos depois, regressaria a Bissau com dezenas dessas fotografias para pendurar na parede e mostrar a quem as quizesse ver. Não o feito artístico, que diziam que também lá estava, mas o milagre daquele gesto de resgate que se substituíra ao tiroteio. Fotografias em vez de balas.

No dia da inauguração, no Centro Cultural Português, em Bissau, apareceu muita gente para ver as fotografias. Quase todos jovens estudantes, provavelmente na idade que o Tenente tinha quando chegara a Bissau para lutar na guerra.

Eram alegres e ruidosos, desinibidos, interpelavam o Tenente sobre isto e aquilo. Houve um que até lhe perguntou se ainda era comunista, como constava da folha de sala.
O Tenente deliciou-se com aquelas conversas, sem se deixar perturbar por saber que nunca lhes conseguiria transmitir a complexidade dos seus próprios sentimentos.

A fotografia, para o Tenente, ficaria definitivamente marcada por aquele momento inicial na Guiné. A fotografia como forma de viver, ou de sobreviver. Afirmação íntima contra a inevitabilidade do tempo e contra as inevitabilidades de cada tempo.
A fotografia não mais o abandonou. E aos setenta anos, como aos vinte, continua a desempenhar o seu papel de argamassa interior, lingando os tijolos da memória.

(Extractos do livro "Crónicas de um Tenente, Guiné-Bissau 1968-2018")

sábado, 17 de novembro de 2018


QUINTA DA FONTE (Centro Comunitário) - "Em vez de Balas"





"Em vez de balas" - Centro Comunitário da Apelação
(Quinta da Fonte)
17 de Novembro 2018
Projecção de fotografias feitas na Guiné - 1968 e 2018





Em vez de balas


No dia 1 de Maio de 1968, larguei do Tejo, rumo à Guiné, a bordo da fragata Corte Real. Era então um jovem tenente dos fuzileiros, com 22 anos, recém casado, que interrompera os estudos de Economia na Universidade de Lisboa.

Em Bissau integrei a 6ª Companhia, aquartelada no INAB, junto ao Geba.
A nossa missão consistia essencialmente na escolta de combóios de embarcações que levavam abastecimento aos quartéis do Exército.

Subi e desci os principais rios da Guiné comandando, conforme os casos, uma ou duas lanchas de desembarque médias (LDMs). Em ocasiões apoiado por lanchas de fiscalização pequenas (LFPs).
Naveguei no Cacheu até Farim, no Mansoa, no Geba e no Rio Grande de Buba.
Liguei por mar a foz desses grandes rios e também fui a Bolama e a Bubaque.

A guerra era uma realidade penosa para quem como eu, jovem militante comunista, se opunha ao domínio colonial e defendia a independência das colónias. Partilhei esse drama pessoal com a minha mulher, Maria Rosa, que trabalhou como professora de História no Liceu Honório Barreto.

A fotografia constituiu para mim um paliativo. Ao fotografar a dignidade do povo guineense, a beleza das suas mulheres, o porte dos seus homens e o encanto das suas crianças, eu tinha a impressão de estar a fazer um gesto de amizade no contexto da guerra. A disparar fotografias em vez de balas.
É significativo que pouco tenha fotografado da guerra e dos temas militares.

2018 é o cinquentenário da minha chegada a Bissau.
Sinto-me na obrigação de comemorar essa fase tão marcante da minha vida de jovem adulto. Tal como os outros jovens da minha geração aprendi, "no terreno", a grande lição da relatividade da nossa própria cultura.

Visitei de novo a Guiné, em Fevereiro 2018, e percorri os locais por onde passara, e fotografara, há 50 anos. E voltei a fotografar lá com a mesma câmara que então usei.

Foi realizada uma exposição das minhas fotografias, feitas em 1968/69, que teve lugar no Centro Cultural Português de Bissau.
Uma espécie de tributo, para restituição da memória de uma realidade que em grande medida já não existe.

Fechou-se então o ciclo. Como experiência pessoal é uma grande emoção.
Num plano mais geral creio que propiciará reflexões sobre a guerra colonial e  sobre a forma como a viam tantos jovens que politicamente a contestavam.

Fernando Penim Redondo (fjprgm@gmail.com - 912421586)
Quinta da Fonte, 17 de Novembro de 2018